Sete representantes do novo violão brasileiro:
O paulistano Kiko Dinucci vê em sua limitação técnica um fator decisivo na criação da originalidade de seu violão — baseada em batuques de candomblé, rock e guitarra africana. O virtuose catarinense Vitor Garbelotto faz dialogarem violão de concerto e popular, como mostra ao gravar Radamés Gnattali. O pernambucano-carioca Vinicius Castro situa seu violão entre o vigor do cancionista e o cuidado do arranjador, entre Lenine e Luiz Cláudio Ramos.
Três exemplos de músicos que — junto a outros, como Caio Marcio, Rodrigo Campos, Thiago Delegado e Daniel Marques — têm em comum as seis cordas (sete, até oito), a tradição enorme que as acompanha e a tarefa (involuntária, mas real) de formar a cara do violão brasileiro hoje.
As características desse violão são abertas. Passeiam pelo choro — em diálogo com o jazz e o erudito no carioca Caio Marcio, na sofisticada gafieira mineira de Thiago Delegado, no carioca Daniel Marques e seu “violão frevado”, como define. Mas também estão na união de Egberto Gismonti e Baden Powell realizada no capixaba Wanderson Lopez, na linguagem mista de guitarra de jazz do brasiliense Daniel Santiago, nos riffs afro do paulistano Rodrigo Campos e na ginga elaborada do carioca Edu Kneip (“Para o compositor popular, a combinação levada-harmonia é o que o define como violonista”). Mas o que aproxima toda essa geração (na casa dos 20 e 30 anos), num olhar quase unânime dos próprios, é a circulação entre gêneros e escolas.
— Hoje, com YouTube, Grooveshark, todos têm acesso a uma diversidade incrível de culturas — nota Caio. — A informação está dentro de casa. Para quem quer se aprofundar, a internet é uma grande ferramenta.
Garbelotto vai além, chamando a atenção para o reflexo dessa ferramenta no estudo acadêmico do violão:
— A combinação desse acesso com a possibilidade de levar isso a um ambiente como o da universidade está formando um músico diferente do de antes, quando tínhamos os conservatórios, que ensinavam somente o erudito. Hoje, num concerto, o cara toca Bach, Dowland, Piazzolla, Marlos Nobre e Jobim. E, no bis, Pixinguinha. Isso não acontecia. O Raphael (Rabello) trouxe o flamenco para o choro e muitos torceram o nariz. Hoje estão todos mais tolerantes.
Delegado acrescenta:
— As universidades se abriram para o violão popular, e os jovens vêm estudando essa tradição. Há material sobre quase todos os estilos que formatam a música brasileira, do violão do Recôncavo ao sete cordas.
Mas o violão também traça suas novas trilhas fora da academia, como defende Rodrigo:
— Há uma infinidade de compositores que, a partir de Dorival Caymmi, pensaram o violão não só como acompanhamento, mas como um diálogo mais decisivo com a canção. E essa tradição tem na essência a criação, não está ligada, necessariamente, ao virtuosismo ou ao academicismo. É o brasileiro pegando o mais acessível e mais barato instrumento harmônico e se expressando — diz. — Assim como o violão do João Bosco nasceu no processo de trabalhar matrizes como Caymmi e Baden, hoje outros estão criando novas matrizes nesse processo de rever o passado e lidar com o presente.
Apesar da abertura, alguns arriscam características formais que ligam a geração:
— Tenho visto cada vez mais forte o violão ritmado — diz Vinicius. — Isso, somado a harmonias mais livres, resulta num violão que poderia ser uma mistura de Guinga com Lenine.
Características regionais
Baden é a linha mestra entre esses músicos na visão de Wanderson, multi-instrumentista que toca um violão de oito cordas:
— Ele continua representando o estilo brasileiro: choro, jazz e música erudita executados com sofisticação e vigor técnico.
Se a busca pela inovação, por um lado, é questionada por Rodrigo e Caio (que diz que ela “pode se tornar superficial ou resultar numa linguagem hermética”), Daniel Marques a valoriza:
— Tenho muita influência, mas toco do meu jeito. No sete cordas mais ainda, desenvolvo uma técnica que nunca vi ninguém fazer — afirma. — O virtuosismo malabarístico pode ser uma carta na manga, mas está longe de ser o mais importante. O que importa é ter originalidade, e isso pode ser imperceptível a ouvidos desatentos.
Mesmo com as referências ao alcance de um clique, as escolas regionais ainda se afirmam (“Minas tende para a coisa da harmonia, o Sul tem o virtuosismo e rítmica característicos, o carioca dá continuidade à tradição do choro, do samba”, descreve Daniel Santiago). Mas, além da tradição local, a própria vida de cada região, traduzida nas cordas, resulta em sons diferentes.
— O meu violão tem a ver com São Paulo, com a cidade, com a dureza, o cinza — avalia Dinucci, que resume de algum modo o olhar amplo de seus colegas. — Não tenho ouvidos apenas para o violão, amo música brasileira, e ela vem em diferentes formatos. O violão deve ser assim também.
segunda-feira, 18 de junho de 2012
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